Estamos
no ano de dois mil e cinco, Antônio é proprietário de uma pequena oficina mecânica
na cidade de Santo André – SP., cuja renda auferida não está sendo suficiente
para arcar com todas as despesas da família, em especial, pelo fato da sua
esposa estar em tratamento contra um câncer de mama bem agressivo.
Antônio
já vivenciou outra realidade, no começo dos anos dois mil, era proprietário de
uma oficina de porte médio para grande, tinha 30 funcionários, tirava um
pró-labore significativo, conseguia pagar os estudos dos filhos, plano de saúde
de primeira linha para todos, a oficina ficava em prédio próprio, assim como
também o era a sua casa.
Pensando
em crescer ainda mais, se iludiu com a oferta para prestação de serviço a uma
seguradora de grande porte, o que exigiu dele um investimento altíssimo, sendo que
foi necessário ir ao mercado conseguir crédito para adequar a sua oficina aos
padrões exigidos, o que acabou sendo feito, porém, teve que dar o prédio da oficina bem como a sua casa
como garantia do empréstimo.
Infelizmente
ao terminar toda a adequação da oficina, passados menos de seis meses a
seguradora alegando mudança de estratégia rompeu o contrato, deixando Antônio
literalmente na mão, não tendo como honrar com seus compromissos, acabou
falindo em menos de um ano, perdendo todos os seus bens.
Voltando
ao ano de dois e mil cinco, Antônio acaba de deixar a esposa para mais uma
sessão de quimioterapia em um hospital público de Santo André – SP., ficando de
retornar no final da tarde para buscá-la.
De
volta a sua pequena oficina, onde trabalha com o seu filho mais velho de 25
anos de idade, já o filho mais novo com 21 anos de idade, está cursando o último
ano da faculdade de engenharia elétrica e faz estágio há dois anos em uma
grande empresa multinacional instalada na cidade, com grandes chances de ser
contratado. O filho mais velho teve que abandonar o curso de engenharia
mecânica, por falta de condições financeiras. Antônio cumprimenta o filho, e
segue para o pequeno escritório localizado nos fundos da oficina, verifica os
boletos em atraso, vê os que conseguirá pagar naquele mês, são bem poucos, ao
abrir a gaveta para guardar os boletos que não serão pagos, vê um cartão de
aposta da Mega Sena, que já havia corrido a duas semanas e ele ainda não tinha
conferido.
Separa
os boletos que vão ser pagos e mais o cartão de aposta. Começa o seu dia na
oficina, o tempo passa depressa, logo é hora do almoço, Antônio pega os boletos
e o cartão de aposta e segue até ao banco, faz os pagamentos e em seguida passa
na lotérica. Olha uma vez, não acredita, olha a segunda, não pode ser, limpa os
olhos, verifica de novo, não é possível, ele sem sombra de dúvidas era o
ganhador. A euforia tomou conta, se controlou, guardou o cartão, já estava na
hora de pegar a esposa no hospital, assim o fez e retornou para casa.
Naquela
noite não dormiu direito, amanhecendo o dia, se arrumou, disse a família que o
advogado o havia chamado para falar sobre a ação que movia contra a seguradora,
e com essa desculpa seguiu para a agência da Caixa Federal, onde foi informado
pelo gerente que o prêmio total daquele sorteio fora de cinquenta e um milhões
de reais e que teve apenas cinco ganhadores, o que dava a ele a bagatela de
R$10.200.000,00.
Antônio
tomou uma decisão naquele momento de não contar a absolutamente ninguém, pediu
sigilo absoluto ao gerente, deu carta branca a ele para que fosse feito os investimentos
necessários. José que tinha acabado de ser promovido a gerente não acreditava
na sorte que teve em atender aquele senhor, assim Antônio, deixou investido em várias
aplicações conforme orientações do gerente o valor de R$9.500.000,00 e o restante
deixou em uma conta corrente.
De
volta a sua casa, disse que havia ganho a ação de indenização contra a
seguradora no valor de R$700.000,00, cuja quantia seria suficiente para pagar o
tratamento contra o câncer em um hospital particular e que o filho poderia
retornar a cursar engenharia e ainda sobraria dinheiro para reformar a pequena
oficina.
O
tempo foi passando, a mulher de Antônio se curou, os filhos se formaram e
começaram a vida profissional, e a oficina cresceu.
Agora
estamos no ano de dois mil e dezenove, Antônio está prestes a completar 70 anos
de idade, e as únicas regalias que se concedeu de todo aquele dinheiro foi a
aquisição de uma chácara, localizada em um condomínio na serra do mar, seu
refúgio nesses últimos quinze anos, lá viveu e ainda vive momentos felizes com
a sua esposa, filhos e agora netos. E a outra aquisição foi um fusca 1964,
placa preta, que cuida com todo carinho do mundo.
Antônio
decidiu que na festa em comemoração dos seus 70 anos de idade, irá contar sobre
o prêmio da loteria que havia ganho há 15 anos, e da sua felicidade em ter a
esposa ao seu lado e em ver os filhos transformados em pessoas responsáveis e
pais de família. Para isso, precisava saber o quanto aquelas aplicações tinham-lhe
rendido, ao chegar no Banco e se identificar, o gerente geral da agência veio
ao seu encontro, e para a surpresa de Antônio, era o mesmo gerente da época em que abriu
a conta:
- José
não acredito que você ainda está por aqui!
- Nem
me fale Antônio, mas, sou eu que não acredito que em todos esses anos, o senhor
não tenha sacado um centavo sequer daquele dinheiro.
- Você
cuidou bem dele para mim José?
- Claro
que sim! Bati todas as minhas metas nos últimos quinze anos graças ao senhor.
- E
quanto eu tenho José?
- O senhor
tem até o presente momento a quantia de aproximadamente trinta e seis milhões
de reais.
- Acho
que já dá para gastar um pouquinho.
- Também
acho.
- José
os meus filhos ainda têm conta aqui, correto?
- Eles
possuem sim.
- Por
favor, separa para mim R$700.000,00 e divida o restante na conta dos dois.
- Será
feito Antônio.
-
Obrigado José.
Durante
a festa de aniversário, Antônio chama a esposa e dois filhos para a sala, conta
toda a história, entrega nas mãos dos filhos os comprovantes de transferências.
A esposa
e os filhos estão espantados e sem palavras.
Antônio
quebra o silêncio, me perdoem não ter contado antes, mas que eu saiba ninguém
aqui passou necessidade alguma nesses quinze anos. Passamos?
Não. Responderam
unânimes.
Da
mesma forma que eu me deixei levar uma vez pela minha ganância e fui a falência
total, fazendo todos sofrerem, principalmente a mãe de vocês, fiquei com medo
que não conseguisse que os meus filhos se tornassem homens de fibra se a vida lhes
fosse fácil demais.
Peço
desculpas a todos, mas, vocês são o meu prêmio maior.
Todos
se emocionaram e agradeceram ao pai e ao marido, que sempre esteve presente em
todos os momentos daquela família
Antônio
pergunta aos filhos, o que vocês vão fazer com todo esse dinheiro?
Pai, pelo
visto o gerente José, vai continuar batendo as suas metas por muito tempo.
Silvio
Klinguelfus Junior
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