Deus tocou o meu coração e minha alma,
abrindo meus olhos para a verdadeira essência da vida.

16 de abril de 2020

VIDA...



Marcos encontra-se sentado e apoiado com os cotovelos na mesa do escritório de sua residência, olhos marejados, mãos pressionando o semblante. Na mesa, uma carta de despedida, uma arma de uso pessoal, papéis organizados de forma que as pessoas pudessem facilmente entender com as explicações constantes da carta.

Já estava nessa posição há algumas horas, pensando em tudo que estava acontecendo em sua vida, como se um filme estivesse passando diante dos seus olhos e os pensamentos forem longe.

Marcos nasceu no interior de São Paulo no ano de 1966, teve uma infância boa e após terminar o colegial foi aceito na Universidade de São Paulo, onde cursou Engenharia Química.

Após formado começou a trabalhar como trainee em uma multinacional americana sendo transferido posteriormente para a sede da empresa localizada no Texas, Estados Unidos, depois de dez anos de empresa, com doutorado e mestrado em renomada Universidade Americana, surge a oportunidade de voltar ao Brasil, para novamente trabalhar onde tudo começou, agora já com cargo de gerente industrial, casado e pai de duas filhas.

E assim, retornou ao Brasil, início dos anos 2000, mais precisamente ano de 2.002, a empresa ficava em Cubatão, optou por morar na cidade de São Paulo, devido aos estudos das suas filhas e o trabalho da sua esposa que também era engenheira. 

A vida seguiu o seu fluxo, já estamos no ano de 2006, Marcos agora assume o cargo de Diretor de Área, o qual trás junto uma responsabilidade enorme, passa a deter o conhecimento de muitos segredos industriais, um novo contrato de trabalho é feito, muitas obrigações, declarações de sigilo, o salário em si, não mudou tanto, porém os benefícios do cargo, mais que triplicavam o seu salário, despesas com moradia, motorista, carros para o casal, despesas com as escolas dos filhos, plano de saúde ilimitado, entre tantos benefícios um lhe chamou a atenção, se tratava de um seguro de vida vitalício altíssimo feito através de uma famosa seguradora americana, cuja beneficiária era a própria empresa, o RH da empresa juntamente com o jurídico lhe esclareceu como funcionava esse seguro. O cargo que ela assumiria necessita desse seguro, pois caso ele viesse a falecer as perdas da empresa, seriam significativas até que outra pessoa pudesse o substituir, esse era o procedimento padrão da multinacional americana para esses casos, porém, por tratar-se de um seguro de vida vitalício, após 05 (cinco) anos no cargo, caso venha a se desligar da empresa por qualquer que seja o motivo, o seguro passará a beneficiar a família, seria uma espécie de indenização, lembrando que o mesmo é corrigido.

Pulando para o ano de 2.013, Marcos contava com 47 anos de idade, se vê pela primeira vez na sua vida como um desempregado, a multinacional americana encerrou as atividades no Brasil e o dispensou do cargo. Durante dois anos continuaria recebendo o salário, mas sem os benefícios, com exceção do plano de saúde e o seguro de vida vitalício, e nesse período, por força de contrato, não poderia trabalhar em nenhuma outra empresa da área química.

A situação não era das piores, muito pelo contrário, dois anos de salário, não muito alto para o padrão de vida que eles levavam, com uma das filhas acabado de entrar em uma conceituada faculdade de medicina particular e outra terminando o colegial no mais caro colégio de São Paulo, só isso praticamente levava todo o salário, entretanto, recebera uma bela indenização, que com a ajuda de uma corretora de valores, está investindo bem e o rendimento dá para manter a família praticamente sem grandes mudanças na vida que levavam.

Pensava que não seria difícil voltar ao mercado de trabalho após a quarentena imposta pela condição do seu cargo anterior, nesse período fez cursos no Brasil e Exterior, contratou um headhunter para fazer a transição da carreira.

Tudo planejado, tudo certo na cabeça dele, só não contava que não conseguiria mais voltar ao mercado de trabalho, já era o ano de 2.017, portanto, dois anos já haviam decorrido do término da sua quarentena, e nada de conseguir um emprego, diante das despesas que não diminuíram e da necessidade de fazer algo, resolveu empreender e abrir uma empresa que tristemente faliu em 2.019, levando o seu capital. 

Agora de volta ao presente (março de 2020), sentado no escritório da sua casa, pensava sobre o grande erro de ter se achado acima da média, que conseguiria voltar ao mercado de trabalho, de não ter tomado medidas drásticas para reduzir o padrão de vida da sua família, de ter feito apostas erradas, enfim, de se deixar levar pelo seu orgulho, enquanto isso, olhava fixamente para a apólice de seguro vitalício da gigante norte-americana, as cifras são impressionantes, todos os problemas financeiros da família seriam resolvidos, mais uma vez pensou na esposa e nas filhas, pensou em Deus, pediu perdão. Pegou a arma, engatilhou, colocou dentro da boca, nisto toca o telefone, ele sai do transe, atende a ligação, era o headhunter dando a notícia que ele acabara de ser readmitido pela mesma multinacional americana, para assumir um cargo de diretoria agora para gestão estratégica da América Latina.

Acredite quem quiser. 

Silvio Klinguelfus Junior.

Nenhum comentário:

Postar um comentário