Já passavam
das três horas da madrugada e nada do sono chegar. Nelson já tinha assistido a
televisão, lido um livro, rezado e nada.
O pior
era que o dia estava repleto de compromissos importantes, e uma noite onde
conseguisse dormir muito bem, viria a calhar, entretanto, a ansiedade tomou conta,
só pensava em como deveria proceder diante de tantas situações que lhe
aguardavam.
Assim
as horas foram passando e conseguiu cochilar por volta das cinco horas da manhã,
mas, logo acordou assustado com o som do alarme do despertador que marcava exatamente
6:15 h.
Parecia
que havia levado uma surra, levantou-se com muito custo, tomou um banho, fez a
higiene pessoal, se arrumou com esmero, o dia seria puxado, não tinha dúvidas,
entretanto, seria recompensador.
Ao
chegar à garagem do Edifício onde o seu carro estava estacionado, entrou e deu
partida e nada do carro funcionar, pensou consigo mesmo: nada de desespero, vou
de taxi.
Chegando
ao ponto de taxi que fica próximo a sua residência, não havia nenhum carro,
esperou dez minutos e nada, olhou o relógio, fez as contas, se pegar um ônibus
até a estação do metrô do Tatuapé, conseguirá chegar com folga ao primeiro e
mais importante compromisso do dia.
Rumou
ao ponto de ônibus, os quatro primeiros passaram lotados, conseguir pegar o próximo,
seguiu espremido até desembarcar na estação do Tatuapé, novamente olhou as
horas, já não tinha mais margem para atrasos. Ao descer as escadas de acesso ao
terminal, parecia que São Paulo inteira estava se utilizando do transporte público,
infelizmente foi preciso muita paciência para conseguir embarcar.
Dentro
do vagão, a situação não era diferente a do ônibus, seguiam como sardinhas,
para ajudar o ar condicionado não estava dando conta e o calor já beirava o
insuportável, quando de repente o metrô para de funcionar, escuridão total, as
luzes de emergência se acendem, dez minutos depois o vagão começa a se mover
novamente.
Pelas suas
contas, já está atrasado, a viagem até a estação Marechal Deodoro que demoraria
em média 20 minutos, agora já estava na casa dos 40 minutos.
Já desanimado
ao descer na estação Mal. Deodoro, seguiu para o próximo trajeto que seria a
pé, são pelo menos cinco quarteirões seguindo em linha reta pela Rua das
Palmeiras, até chegar ao Prédio onde fica o seu escritório, assim que começou a
caminhada, mais uma surpresa, uma chuva dessas de lavar a alma, não durou mais
do que três minutos, tempo suficiente para pegar Nelson no meio do caminho
entre a estação e a primeira marquise de um prédio onde poderia se abrigar.
Agora
o quadro estava completo, atrasado e ensopado, o que mais poderia acontecer,
dessa forma seguiu rumo ao trabalho, começou a mancar, acabará de perder um
salto do sapato, que passou boiando pela enxurrada em direção a boca de lobo.
Ao
chegar ao prédio onde fica o seu escritório, os três elevadores não estavam
dando conta da quantidade de pessoas, as catracas de acesso estavam lotadas,
não teve dúvidas, já estava literalmente ferrado, resolveu subir pelas escadas
os dez andares, tirou os sapatos, as meias e começou a subir, quando estava no
oitavo andar, sua respiração estava ofegante, o coração batia forte e as pernas
estavam trêmulas, pensou em desistir, parou um pouco respirou, se curvou, apoiou
os braços nas pernas, respirou e resolveu continuar.
A muito
custo conseguiu terminar os dois andares que faltavam, as escadas deste edifício
davam acesso a parte de trás das salas comerciais, enquanto os elevadores pela
parte da frente, somente quando Nelson parou de frente a porta é que se lembrou
que emprestará a chave da porta dos fundos para André, seu sócio. O escritório
pegava todo o andar e àquela era a única porta de acesso pelos fundos. Os seus funcionários
começariam a chegar apenas a partir das nove horas. A pedido do cliente havia
marcado a reunião mais cedo. Mesmo assim resolveu bater à porta, obviamente que
ninguém atendeu, pois ele seria o primeiro a chegar naquele dia.
Estamos
no início do ano de 1.990, os celulares ainda não haviam começado a operar no Brasil.
Dessa forma, Nelson não teve alternativa a não ser descer novamente os 10 andares.
Durante a descida pensava que o negócio não era para dar certo, já faz dez
meses que eles estavam negociando essa parceria, que seria fantástica para o seu
escritório, infelizmente depois desse atraso, provavelmente tudo teria ido
literalmente por água abaixo, tendo que começar a remar tudo novamente.
Ao
chegar ao térreo o segurança que era amigo de Nelson, sorriu ao vê-lo descalço,
despenteado, ensopado e esbaforido, sem dar tempo de o segurança falar qualquer
coisa, emendou, se abrir a boca, vamos sair no braço, Antônio não aguentou e
caiu na gargalhada.
Os elevadores
já não estavam tão cheio o próximo período de movimento seria as 9:00 horas,
assim, Nelson entrou sozinho no elevador e pode ver quando a porta estava quase
se fechando, que entrava no prédio uma mulher correndo, toda molhada com o
cabelo escorrido e com os sapatos de salto altos em uma das mãos, a porta se
fechou e ele sorriu, novamente olhou para o relógio, 50 minutos atrasado, ninguém
esperaria no corredor todo esse tempo, ainda mais se tratando do representante
do maior e mais respeitado escritório de advocacia da cidade de São Paulo, quiçá,
do Brasil.
As
sair do elevador, viu que não tinha ninguém no hall de acesso, se olhou no
espelho, estava deplorável, não era para menos que Antônio o segurança havia caído
no riso. Assim, resolveu mudar os seus pensamentos, esboçou mais um sorriso,
lembrou daquela mulher que estava em situação pior do que a dele.
Nem
bem Nelson havia entrado em seu escritório, ouviu algumas batidas a porta, e lá
foi ele manquitolando abrir ver quem era, provavelmente deveria ser algum
funcionário chegando. Ao abrir a porta, foi surpreendido pela aquela mesma
mulher que ele havia visto chegar ao prédio, ela estava em pior estado do que
ele, entretanto, ela continuava linda, tratava-se sem dúvida de uma linda mulher.
- Em
que posso ajudá-la?
- Tenho
uma reunião agendada com o Dr. Nelson e estou atrasada, será que ele poderia me
receber, eu sou Valentina, sócia do escritório G & P Advogados e Associados.
- Doutora
Valentina, é um prazer recebê-la em meu escritório, eu sou o Dr. Nelson, muito
prazer. Me desculpe pelo meu estado.
Os
dois riram muito da situação, inacreditavelmente Valentina havia enfrentado
problemas semelhantes para chegar até o escritório.
Nelson
propôs a Valentina que a eles se recompusessem dentro do possível e que ela o acompanhasse
até a uma loja de departamento muito famosa que ficava na esquina.
Assim
o fizeram, foram as compras, se arrumaram a contento nos provadores, a loja de
departamento, contava ainda com com um salão de beleza completo, o qual Valentina
aproveitou para arrumar os cabelos e a maquiagem, enquanto isso Nelson cortou
os cabelos e aparou a barba.
Agora
recompostos, resolveram atravessar a rua e seguir até uma cafeteria para degustar
um excelente café e aproveitaram para se conhecerem melhor.
Depois
de muitas risadas ficou acertado entre eles, que a parceria estava firmada, pelo
visto para a vida toda, depois de dois anos Valentina e Nelson entravam na
Igreja para se casarem, e adivinhem, caiu um temporal e o casamento quase não
aconteceu, dos dois se atrasaram...
Silvio
Klinguelfus Júnior.