Deus tocou o meu coração e minha alma,
abrindo meus olhos para a verdadeira essência da vida.

30 de março de 2020

O AMOR QUE TRANSFORMA

Dr. Zezualdo respeitável médico de um conceituado Hospital de Fortaleza, ao retornar de um congresso internacional, testou positivo para o novo corona vírus.

Assim que se viu contaminado, tratou de alertar a diretoria do Hospital, pedindo o seu afastamento do cargo de diretor clínico e como estava assintomático, foi para casa em um isolamento voluntário.

Que ironia da vida, fui a um congresso sobre infecções e voltei infectado, e pensava, maldita hora que aceitei participar.

Nascido no sertão nordestino, hoje com 66 anos, filho do Sr. José (88 anos) e de dona Alda (falecida muito nova), o caçula de três irmãos, sendo que os outros dois falecidos enquanto crianças.

Solteirão convicto, chegando em casa, logo lembrou do seu velho pai, com quem sempre manteve um excelente relacionamento, resolveu ligar e contar o que estava acontecendo, o seu pai de imediato pediu para que ele fosse para o sítio:
- Filho somos apenas eu e você, venha para cá.
- Muito perigoso pai, posso contaminá-lo.
- Você tem a sua casa aqui, ficará isolado nela.
- Não sei pai.
- Venha, estou com saudades, adoraria te ver todos os dias nem que seja a distância.
- Está bem pai, estou indo, mas com a condição que eu fique isolado na minha casa.
- Combinado.

Dr. Zezualdo, embora hoje tenha uma excelente situação financeira, a sua realidade quando criança e jovem era outra completamente diferente, assim que seus irmãos mais velhos morreram de febre amarela, seus pais resolveram manda-lo  para casa de um parente na capital do Estado, cuja situação não era muito diferente a deles, entretanto, um mundo de oportunidades se abriu diante dos seus olhos, ele trabalhava de engraxate durante o dia e estudava a noite, e como inteligência não escolhe classe social, ao se formar no colegial em escola pública e ensino noturno, passou em primeiro lugar no curso de medicina na Universidade Federal do Ceará, e assim começou a sua história na medicina.

Mesmo durante o curso conseguiu tratar da sua mãe que sofria do “mal de Chagas”, vindo a falecer poucos anos após ele se formar, não sem antes ver o seu filho dar uma nova condição de vida para eles e a todos os vizinhos do sítio onde nascerá.

Conforme ai ganhando dinheiro como médico, foi transformando a vida dos pais, irrigou o sítio da família, aliás, por exigência do seu pai, que disse que só aceitaria ajuda se fosse para todos da região, dessa maneira todos os sitiantes lindeiros se beneficiaram da irrigação, transformando aquele pequeno vilarejo em um próspero oásis no meio do sertão. 

Recebeu e recebe em sua casa muitos filhos dos vizinhos da sua família, dando oportunidades de estudo para todos.

Ao partir da capital para o interior, teve o cuidado de informar ao médico do pequeno vilarejo que estava contaminado, mas que ficaria em isolamento em sua casa no sítio. O médico do pequeno vilarejo, que fora um desses jovens que o Dr. Zezualdo recebeu em sua casa, ficou triste com a notícia que recebeu do seu padrinho e colega de profissão, que não só realizou o seu sonho de se tornar médico, como também ajudou a construir o único Hospital da daquela região.

Assim foi feito, o Dr. Zezualdo seguiu para o seu isolamento, as seis horas de viagem de carro até o seu destino passaram rapidamente, o ver o seu pai no meio da roça, um filme passou em sua cabeça, lembranças de uma infância sofrida, mas a certeza que ele foi muito amado pelos seus pais.

Mesmo a distância, como se possível, ambos se abraçaram virtualmente, o olhar de cumplicidade e de amor era imenso entre agora dois senhores.

Durante vinte e cinco dias a rotina tomou conta da vida, todos os dias recebia em sua casa refeições preparadas por Dona Jurema, mãe do médico do vilarejo, e o seu pai todas as manhãs preparava um café reforçado que nunca faltava mel e própolis, que o seu velho dizia que o salvaria, e a noite os dois tomavam juntos, um de cada lado da janela, uma caneca de leite com alho e conhaque, que o doutor quase vomitava após tomar e o fazia transpirar a noite inteira, mas que por exigência do seu velho pai, tomava de bom coração, hoje ele era o paciente.

Todas as manhãs por volta da 5:30 h, via o seu pai deixar o café preparado na cozinha da sua casa e seguir para roça sozinho. Ficava pensando, 88 anos de idade, não parece, que disposição, mas estranhou que o pai sempre seguia sozinho por todos os lugares, aquilo o preocupou, mas naquele momento não podia fazer nada.

Ao receber a visita do seu afilhado e médico do vilarejo, que lhe trouxe o resultado do novo teste para o corona vírus feito cinco dias antes, a surpresa tomou conta da sua vida, não só por saber que o resultado tinha dado negativo, que estava curado, mas por ser comunicado pelo médico que o seu pai também havia testado positivo para o vírus, e que igualmente ao filho estava curado.


Naquele dia ao retornar da roça, os dois finalmente puderam se abraçar e o Dr. Zezualdo com lágrimas nos olhos, perguntou por que ele não lhe havia dito que também tinha sido contaminado.

O pai lhe respondeu:
- Filho o paciente era você, seu eu lhe tivesse contado você ficaria preocupado e com um sentimento de culpa de ter trazido a doença, mas para mim nada disso importa, pois a felicidade que a sua presença me trouxe é tamanha que eu poderia morrer amanhã que iria feliz, também tomei cuidados orientado pelo Dr. Carlinhos, fiquei isolado das pessoas durante todo esse período, era apenas eu você e Deus, companhia melhor não há.
- Pai eu te amo.
- Eu também te amo filho.

E ali quando dois corações se encontram entre braços a certeza que o amor supera qualquer barreira.

De volta a Capital, Dr. Zezualdo está na linha de frente do combate ao vírus, pensava, bendita a hora que aceitei participar daquele congresso.

Obrigado Pai.

Silvio Klinguelfus Júnior.

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