Já era
alta madrugada, quando Zé Roberto subia com sua Harley Davidson Fat Boy Special
2011, a Serra do Mar, que liga o Município de Ubatuba – SP., ao de Taubaté –
SP., pela famosa Rodovia Oswaldo Cruz, que para alguns é um desafio, para
outros como o nosso amigo Zé Roberto, era um prazer inenarrável trafegar por
ela. Assim sozinho na estrada, apreciando a leve brisa em uma noite quente de
verão, quando de repente passa zunindo por ele uma moto Big Trail.
Ele
ficou curioso, ainda mais por perceber tratar-se de uma mulher que estava
pilotando, essa curiosidade levou o nosso experiente motociclista a acelerar um
pouco mais, porém, logo percebeu ser quase impossível de acompanhá-la, pode ver
a distância a lanterna traseira da possante Big Trail desaparecer nas
acentuadas curvas da serra.
Desencanou,
tirou a mão do acelerador e voltou ao seu ritmo normal, depois de alguns bons
quilômetros rodados, chegou a um ponto de parada, tratava-se de um Empório, que
havia acabado de abrir as portas para começar o dia, resolveu parar para
esticar as pernas e tomar um café.
Zé
Roberto, é dono de uma rede com 03 lojas de roupas masculinas, uma em Ubatuba,
outra em Taubaté e a terceira e última que é recém-inaugurada na cidade de
Campos do Jordão – SP., portanto, para ele, viajar nessa Rodovia além de ser um
prazer é praticamente o quintal da sua casa.
Ao
entrar no empório, logo procurou pela motociclista que passou por ele há pouco
na estrada, estava curioso, pois é muito difícil encontrar bons pilotos que
desafiem as curvas fechadas ainda mais em plena madrugada e com tamanha
habilidade, sem sombras de dúvidas, se tratava de uma excelente piloto, porém, nem
sinal dela, perguntou aos atendentes se haviam visto ela por lá, tendo sido a
resposta negativa.
Mais
uma vez, deixou seus pensamentos para lá, tomou o seu café e seguiu o seu
caminho rumo a sua loja em Taubaté.
Passaram-se
quase seis meses, e agora Campos do Jordão, bombava em plena alta temporada, Zé
Roberto, praticamente subia a Serra que liga Taubaté a Campos do Jordão todos
os dias, porém, as sextas-feiras, para evitar o trânsito do período, resolvia
ficar na cidade retornando apenas as segundas-feiras.
Em uma
dessas suas subidas de madrugada, pela referida Serra, em pleno inverno, o
termômetro da sua Harley Davidson, marcava 2º graus negativos, ele todo
parlamentado, vestia uma segunda pele, calça jeans grossa, camisa de veludo,
uma blusa de lã pesada e por cima disso tudo, um casaco de couro forrado, e se
não bastasse para evitar a neblina muito úmida daquela região principalmente
nas madrugadas, costumava usar sempre uma capa de chuva, que na realidade tinha
dupla função, impedir que a sua roupa molhasse e principalmente evitar a
entrada do vento gelado e úmido.
Assim
praticamente uma múmia, Zé Roberto seguia pela Rodovia, quando vê pelo
retrovisor o farol de uma moto que se aproximava rapidamente e mais uma vez o
deixou comendo poeira na estrada.
Dessa
vez, conseguiu observar melhor o modelo da moto e a silhueta da piloto, que
vestia uma macacão inteiriço de couro desses de pilotos de corrida de motos
esportivas, o qual era de fácil visualização, branco, com listras vermelhas e
alguns detalhes em lilás nos ombros.
Nem
tentou acompanhar, era inútil tamanha a perícia da piloto e como da outra vez,
ela desapareceu nas curvas.
Chegando
em Campos do Jordão, passou pelos postos de combustíveis e padarias que estavam
abrindo naquele momento, uma curiosidade o corroía por dentro, queria, mesmo
sem saber o porquê, conhecer aquela mulher que lhe causava tanta admiração,
porém, foi em vão, ela não estava em nenhum deles, deu mais uma volta pelo
centro da cidade e acabou desistindo, seguiu para a sua loja e a preparou para
a abertura de logo mais, com certeza o final de semana prometia, a previsão do
tempo era de muito frio e os hotéis estavam com a capacidade máxima reservada.
No
transcorrer do final de semana de dentro da sua loja lotada, viu quando àquela moto
passou em frente dela e seguiu rumo ao centro que ficava a poucos metros de
distância.
Não
hesitou, deixou a sua gerente tomando conta da loja e saiu dizendo que iria
tomar um café, na realidade o motivo era outro. Seguindo a pé pela rua logo
avistou a moto estacionada junto ao meio-fio, não teve dúvidas, tirou uma foto
da placa, para o caso de não encontrar a dona. Logo em frente havia um hotel
que tinha uma cafeteria com um solário que dava para ver bem o local onde a
moto estava estacionada. Nunca demorou tanto para tomar um café, acabou
experimentando quase todos os salgados do cardápio e nada da motociclista
aparecer. Resolveu pagar a conta e voltar para loja, no exato momento que se
dirigiu ao caixa para pagar a conta, escutou a partida da moto, tentou correr
para chegar à calçada, porém, mais uma vez em vão.
Naquela
noite, no quarto do hotel, ele olhava a foto da placa da moto, não tinha como
saber a cidade e muito menos quem era a dona, lembrou-se do seu irmão Guima,
delegado de polícia, mas soaria muito estranho ele mandar uma mensagem para o
irmão pedindo que descobrisse quem era a dona da moto e o endereço. Resolveu
deixar aquilo de lado, conhecia a integridade do irmão e jamais pediria isso a
ele.
Zé
Roberto um divorciado na casa dos 50 anos, há dois anos não tinha nenhum
relacionamento sério, o último durou quase um ano, não deu certo, enfim...
O
tempo novamente passou depressa, estávamos agora no final do ano, em uma festa que
antecedia ao final de ano em uma casa alugada em um condomínio da cidade de
Ubatuba, a família de Zé Roberto estava se divertindo muito, e o assunto da
motociclista fantasma surgiu e o seu irmão Guima se interessou:
- Que
história mais legal Zé, e você ainda tem a foto da placa;
-
Tenho sim, mas não acredito que cometeria uma infração para me ajudar.
- Não
é nada disso Zé, praticamente todos os policiais e não policiais (funcionários
do DETRAN) tem acesso irrestrito as placas, basta ter o aplicativo “VIO”
instalado no celular e a liberação/autorização no sistema, que conseguimos
consultar qualquer placa através do QrCode impresso nela, não há nenhum crime
nisso, veja só.
Em
poucos segundos apareceu os dados. O irmão começou a sorrir incrédulo, fechou o
aplicativo e não falou mais nada. Zé Roberto o questionou, e o irmão apenas se
limitou a dizer:
- Zé,
você já ouviu falar em operação verão e operação inverno das Polícias do Estado
de São Paulo.
- Sim.
-
Então deixa assim.
Seu
irmão saiu, fez um telefonema, voltou para a festa como se nada tivesse
acontecido, Zé Roberto, não entendeu absolutamente nada, mas como amava o seu
irmão, sabia que não podia pedir maiores informações, pois isso poderia
prejudicar a sua carreira.
Passados
menos de 30 minutos o interfone da casa tocou, Zé atendeu:
- Boa
noite.
- Boa
noite.
- Aqui
é casa onde o Dr. Guimarães está passando a sua folga.
- Quem
quer saber?
- É a
superiora dele, Dra. Valentina Albuquerque.
- Pois
não, só um minuto.
- Sim.
O
irmão do Zé, rapidamente foi receber a Valentina, que agradeceu o convite para
a festa.
Dr.
Guimarães logo apresentou sua superiora a todos, tendo sido ela muito bem
recebida, inclusive por Zé Roberto, que de imediato se encantou pela beleza
daquela jovem senhora, que não aparentava ter mais de 40 anos de idade, mas que
na realidade já passava e muito dos 40, tinha apenas um ano a menos que ele.
Guimarães explicou que a Dra. Valentina morava em São José dos Campos – SP., e
que durante as operações de verão e inverno da Polícia, ela assumia o comandado
daquela região inteira e se locomovia por elas constantemente, e por ser
antevéspera de Ano Novo, tinha acabado de sair de seu plantão da delegacia em
Ubatuba.
Seu
irmão chamou Valentina e o Zé, e disse assim:
- Zé,
aqui está a sua motociclista fantasma.
- Como
assim? Eu não acredito!
-
Valentina, aqui está aquele cara que você falou que era maluco e que passou
duas vezes por ele na estrada durante a madrugada.
- Meu
Deus, eu não acredito Guima!
- Sim.
Eu apresento vocês dois. As duas pessoas mais malucas que eu conheço.
E
assim, de uma forma totalmente inesperada, Zé e Valentina se conheceram para
nunca mais se separarem, ela uma delegada de polícia condecorada, tendo
especialização em pilotagem de motos e de helicópteros, com diversos cursos de
pilotagem nos mais diversos países e ele um empresário louco por Harley
Davidson, que já rodou o mundo pilotando pelas mais desafiadoras estradas.
Poucos
minutos depois de se conhecerem já traçavam planos para tomarem um café no dia
seguinte a 200 km de distância de onde estavam.
Só os “loucos”
vão entender.
Silvio
K. Jr.